sexta-feira, 12 de julho de 2019

A REPÚBLICA DO SILÊNCIO Jean-Paul Sartre

A REPÚBLICA DO SILÊNCIO 
Jean-Paul Sartre 
(Les Lettres Françaises, 09.09.1944) 
Tradução de Rachel Gutiérrez. 
Nunca fomos mais livres do que durante a ocupação alemã. Tínhamos perdido 
todos os nossos direitos e, em primeiro lugar, o de falar; éramos ultrajados a cada dia e 
tínhamos de nos calar; éramos deportados em massa como trabalhadores, como judeus, 
como prisioneiros políticos; em todo lugar, nos muros, nos jornais, nas telas de cinema, 
reencontrávamos o semblante imundo que nossos opressores queriam nos dar de nós 
mesmos: por causa de tudo isso éramos livres. Porque o veneno nazista se infiltrava até 
no nosso pensamento, cada pensamento justo era uma conquista; porque uma polícia 
todo-poderosa tentava nos constranger ao silêncio, cada palavra se tornava preciosa 
como uma declaração de princípios; porque estávamos encurralados, cada um de nossos 
gestos tinha o peso de um engajamento. As circunstâncias muitas vezes atrozes de nosso 
combate nos tornaram capazes de viver, enfim, sem disfarces e sem véus essa situação 
dilacerada, insuportável que se chama a condição humana. O exílio, o cativeiro e, acima 
de tudo, a morte que mascaramos habilmente nas épocas felizes, eram os motivos 
perpétuos de nossas preocupações, percebíamos que não são acidentes evitáveis, nem 
mesmo ameaças constantes, mas exteriores: era preciso reconhecer nelas nosso quinhão, 
nosso destino, a fonte profunda de nossa realidade de homem; a cada segundo vivíamos 
em sua plenitude o sentido desta pequena frase banal: "Todos os homens são mortais." E 
a escolha que cada um fazia de si mesmo era autêntica porque era feita na presença da 
morte, porque poderia sempre se expressar como "Melhor morrer do que...". E não falo 
aqui daquela elite que foram os verdadeiros Resistentes, mas de todos os franceses que, a 
cada momento do dia e da noite, durante quatro anos, disseram não. A própria crueldade 
do inimigo nos empurrava até os extremos de nossa condição, constrangendo-nos a fazer 
as perguntas que evitamos na paz: todos aqueles dentre nós – e que francês não esteve 
uma ou outra vez nessa situação? – que conheciam alguns detalhes interessantes da 
Resistência se perguntavam com angústia: "Se me torturarem, vou aguentar?" Assim, a 
própria questão da liberdade se impunha e nós estávamos no limiar do conhecimento 
mais profundo que o homem pode ter de si mesmo. Porque o segredo de um homem 
não é o seu complexo de Édipo ou de inferioridade, é o limite mesmo da sua liberdade, é 
seu poder de resistência aos suplícios e à morte. Aos que tiveram uma atividade 
clandestina, as circunstâncias de sua luta traziam uma novidade: não combatiam à luz do 
dia, como soldados; encurralados na solidão, presos na solidão, foi no abandono, no 
desamparo mais completo que eles resistiram às torturas: sozinhos e nus diante dos 
carrascos bem barbeados, bem nutridos, bem vestidos que escarneciam de sua carne 
miserável e a quem uma consciência satisfeita e um poder social desmesurado davam 
todas as aparências de terem razão. No entanto, no mais profundo dessa solidão, eram os 
outros, todos os outros, todos os camaradas da resistência que eles defendiam; uma só 
palavra seria suficiente para provocar dez, cem detenções. Essa responsabilidade total, na 
solidão total, não é o próprio desvelamento da nossa liberdade? Aquele desamparo, 
aquela solidão, aquele risco enorme foram os mesmos para todos, para os chefes e para 
os homens; tanto para os que levavam mensagens cujos conteúdos ignoravam quanto 
para os que tomavam decisões sobre toda a resistência, uma única sanção: a prisão, a 
deportação, a morte. Não há exército no mundo onde se encontre semelhante igualdade 
de riscos para o soldado e para o generalíssimo. E é por isso que a Resistência foi uma 
democracia verdadeira: o mesmo perigo para o soldado e para o chefe, a mesma 
responsabilidade, a mesma liberdade absoluta na disciplina. Assim, na sombra e no 
sangue, a mais forte das Repúblicas foi constituída. Cada um de seus cidadãos sabia que 
se devia a todos e que só podia contar consigo mesmo; cada um compreendia, no mais 
completo desamparo, seu papel histórico. Cada um deles, contra os opressores, decidia, 
empreendia ser ele mesmo, irremediavelmente, e escolhendo a si mesmo em sua 
liberdade, escolhia a liberdade de todos. Essa república sem instituições, sem exército e 
sem polícia, era preciso que cada francês a conquistasse e a afirmasse a cada instante 
contra o nazismo. Eis-nos agora, às vésperas de uma outra República: não podemos 
esperar que ela conserve à luz do dia as austeras virtudes da República do Silêncio e da 
Noite. 
LA REPUBLIQUE DU SILENCE 
Jamais nous n'avons été plus libres que sous l'occupation allemande. Nous avions perdu 
tous nos droits et d'abord celui de parler ; on nous insultait en face chaque jour et il fallait 
nous taire ; on nous déportait en masse, comme travailleurs, comme Juifs, comme 
prisonniers politiques ; partout sur les murs, dans les journaux, sur l'écran, nous 
retrouvions cet immonde et fade visage que nos oppresseurs voulaient nous donner de 
nous-mêmes : à cause de tout cela nous étions libres. Puisque le venin nazi se glissait jusque dans notre pensée, chaque pensée juste était une conquête ; puisqu'une police 
toute-puissante cherchait à nous contraindre au silence, chaque parole devenait précieuse 
comme une déclaration de principe ; puisque nous étions traqués, chacun de nos gestes 
avait le poids d'un engagement. Les circonstances souvent atroces de notre combat nous 
mettaient enfin à même de vivre, sans fard et sans voile, cette situation déchirée, 
insoutenable qu'on appelle la condition humaine. L'exil, la captivité, la mort surtout que 
l'on masque habilement dans les époques heureuses, nous en faisions les objets 
perpétuels de nos soucis, nous apprenions que ce ne sont pas des accidents évitables, ni 
même des menaces constantes mais extérieures : il fallait y voir notre lot, notre destin, la 
source profonde de notre réalité d'homme ; à chaque seconde nous vivions dans sa 
plénitude le sens de cette petite phrase banale : " Tous les hommes sont mortels. " Et le 
choix que chacun faisait de lui-même était authentique puisqu'il se faisait en présence de 
la mort, puisqu'il aurait toujours pu s'exprimer sous la forme " Plutôt la mort que... ". Et 
je ne parle pas ici de cette élite que furent les vrais Résistants, mais de tous les Français 
qui, à toute heure du jour et de la nuit, pendant quatre ans, ont dit non. La cruauté même 
de l'ennemi nous poussait jusqu'aux extrémités de notre condition en nous contraignant 
à nous poser ces questions qu'on élude dans la paix : tous ceux d'entre nous - et quel 
Français ne fut une fois ou l'autre dans ce cas ? – qui connaissaient quelques détails 
intéressant la Résistance se demandaient avec angoisse : " Si on me torture, tiendrai-je le 
coup ? " Ainsi la question même de la liberté était posée et nous étions au bord de la 
connaissance la plus profonde que l'homme peut avoir de lui-même. Car le secret d'un 
homme, ce n'est pas son complexe d'Œdipe ou d'infériorité, c'est la limite même de sa 
liberté, c'est son pouvoir de résistance aux supplices et à la mort. À ceux qui eurent une 
activité clandestine, les circonstances de leur lutte apportaient une expérience nouvelle : 
ils ne combattaient pas au grand jour, comme des soldats ; traqués dans la solitude, 
arrêtés dans la solitude, c'est dans le délaissement, dans le dénuement le plus complet 
qu'ils résistaient aux tortures : seuls et nus devant des bourreaux bien rasés, bien nourris, 
bien vêtus qui se moquaient de leur chair misérable et à qui une conscience satisfaite, une 
puissance sociale démesurée donnaient toutes les apparences d'avoir raison. Pourtant, au 
plus profond de cette solitude, c'étaient les autres, tous les autres, tous les camarades de 
résistance qu'ils défendaient ; un seul mot suffisait pour provoquer dix, cent arrestations. 
Cette responsabilité totale dans la solitude totale, n'est-ce pas le dévoilement même de 
notre liberté ? Ce délaissement, cette solitude, ce risque énorme étaient les mêmes pour 
tous, pour les chefs et pour les hommes ; pour ceux qui portaient des messages dont ils ignoraient le contenu comme pour ceux qui décidaient de toute la résistance, une 
sanction unique : l'emprisonnement, la déportation, la mort. Il n'est pas d'armée au 
monde où l'on trouve pareille égalité de risques pour le soldat et le généralissime. Et c'est 
pourquoi la Résistance fut une démocratie véritable : pour le soldat comme pour le chef, 
même danger, même responsabilité, même absolue liberté dans la discipline. Ainsi, dans 
l'ombre et dans le sang, la plus forte des Républiques s'est constituée. Chacun de ses 
citoyens savait qu'il se devait à tous et qu'il ne pouvait compter que sur lui-même ; 
chacun d'eux réalisait, dans le délaissement le plus total son rôle historique. Chacun 
d'eux, contre les oppresseurs, entreprenait d'être lui-même, irrémédiablement et en se 
choisissant lui-même dans sa liberté, choisissait la liberté de tous. Cette république sans 
institutions, sans armée, sans police, il fallait que chaque Français la conquière et l'affirme 
à chaque instant contre le nazisme. Nous voici à présent au bord d'une autre 
République : ne peut-on souhaiter qu'elle conserve au grand jour les austères vertus de la 
République du Silence et de la Nuit

quinta-feira, 6 de junho de 2019

Henry Louis Mencken: para todo problema complexo existe sempre uma solução simples, elegante e completamente errada.

Fonte: https://folha.com/5jtm69vy